Uma banda feita no Brasil, pra tocar Rock’n Roll!

Entrevista: Júlio César Bocáter. Foto: divulgação.
Sim, entrevistamos pela primeira vez essa legenda do Rock nacional, o Made In Brazil. Oswaldo Vecchione ao lado de seu irmão Celso, formam os dois pilares que sustentaram a banda nestes mais de 42 anos de atividade ininterrupta, sem se vender para a mídia e sem se render a modismos! Oswaldo solta o verbo abaixo!

RU – Oswaldo, apesar de ser a primeira entrevista conosco, se fossemos passar a limpo sua carreira, a entrevista seria gigantesca. (risos) Então vou me ater aos discos mais recentes e fatos pitorescos, ok? Caso não queira responder alguma pergunta, sem problema, fique a vontade, bem como acrescentar algo que não foi perguntado. Começando, você contabilizou quantas vezes o Made já mudou de formação?
Oswaldo Vecchione – São mais de 150 formações oficias, na verdade já trabalharam comigo e com meu irmão Celso no Made in Brazil mais de noventa músicos. Nesse começo de ano, atualizei a sessão “Heróis” (músicos que já tocaram no Made in Brazil) no nosso site oficial www.bandamadeinbrazil.com.br. Antes só estava constando os nomes e os anos que cada músico tocou no Made, agora depois de 15 dias trabalhando e levantando as informações, atualizei o texto, fazendo constar o que cada músico fez, se atuou em show, em que show tocou, em qual Tournée, e se foi em disco, em qual disco, em qual musica, e vai por aí... O legal é que agora tem também a relação (grande) de amigos, de outras bandas que atuaram no Made em shows e em gravações, Essas informações que vão servir de base para a biografia que esta sendo feita pela jornalista Tuka Fazani (tuca.fazani@hotmail.com). Eu mesmo vou aproveitar esse texto, essas informações no livro que estou escrevendo, “Quarenta e duas histórias de uma Banda Made in Brazil”, que vai ter no final uma biografia reduzida do Made e também uma mini biografia de cada músico que passou pela banda.

RU – Na verdade esse trabalho seu de catalogar todos os membros, que anos eles tocaram, se gravaram discos e tocaram ao vivo, mais essa biografia representam grande parte da história do Rock nacional! Você mudou recentemente para a praia. Algum motivo em especial que possa ser falado? Pois falar de Made é falar da Paulicéia desvairada. Eu fiquei chocado.
Oswaldo Vecchione – Na verdade estou fora de Sampa há quase quinze anos, morei com a Deborah Carvalho que foi minha esposa e também vocalista do Made em Atibaia/SP, por quatorze anos. Com a morte da Deborah em janeiro de 2009, voltei e fiquei uns meses em Sampa, mas me casei novamente e me mudei pra praia em setembro com a Roberta minha mulher atual e nova vocalista do Made em Mongaguá, litoral sul de SP. Era um antigo sonho, morar e transferir a produtora para a praia. 

RU – Afora possíveis motivos particulares, você acha que a cidade já deu o que tinha quer dar? Para mim que sou paulistano na gema, já deu. Poluição, enchente, trânsito, camelôs, todo lugar que você vai é cheio e tem filas, não dá pra aproveitar mais nada, as pessoas sem respeito com tudo e todos, cheio de lixo no chão. O que acha disso tudo?
Oswaldo Vecchione – Gosto muito de Sampa, mas é o que você comentou, a cidade tem muitos problemas, e se conseguirmos viver e trabalhar fora dessa loucura, conseguiremos viver melhor, e essa busca por uma vida melhor, com mais qualidade, que me levou pra Atibaia, e agora pra praia em Mongaguá... Mas como falei, gosto muito de Sampa, da vida noturna, do agito, dos cinemas e teatros, isso não tinha em Atibaia e nem agora na praia... Muito sossego, às vezes incomoda um pouco... (risos)

RU – Além do mais, São Paulo virou a capital do Forró, Funk, Axé, Pagode, ou seja, de tudo, menos do Rock. Isso o inspirou a escrever Rock De Verdade.
Oswaldo Vecchione – Na verdade fiz a letra, fiz esse protesto por tudo, por causa de Sampa, do RJ, de Minas, por causa de algumas cidades grandes como Campinas, onde esses modismos pegou em cheio a massa, que parece que gosta de merda... Incrível, sabe o ditado  “Quanto pior melhor..”, e bem isso aí ... Eu não acredito no mau gosto da maioria da população, gostar de funk (carioca) e o fim do mundo, as letras (que letras?) puta mau gosto, não tem rima, melodia, harmonia, nada... Pura apelação”.  

RU – Pois é até uma ofensa chamar esse lixo de Funk, pois o verdadeiro Funk não tem nada a ver com isso. Como você vê a cena Rocker de São Paulo e do Brasil hoje?
Oswaldo Vecchione – Tem muita banda nova legal em Sampa, como o Baranga, o Carro Bomba, Felipe Goulart & Bala Perdida, Saco de Ratos, entre outras, muita banda nova e legal e Curitiba, em Porto Alegre, algumas no interior do RS, em SC e também no interior do Paraná. O cenário do rock no sul é bem promissor, ainda há uma esperança, ainda existe Rock ‘n Roll no ar... Fora as bandas de Heavy Metal, que são muitas e algumas bem legais, competentes e profissionais, e não vou esquecer das Velhas Virgens e o Marcelo Nova, que estão aí carregando a bandeira do Rock por todo o Brasil, como o Made.

RU – O Made teve uma perda incalculável e insubstituível, a morte de Deborah. Como está sendo a falta dela na banda e se será lançado ou feito algum show em tributo a ela?
Oswaldo Vecchione – A falta da Debinha é monstruosa, insubstituível... Ela além de cantora, além de ser minha mulher, me ajudava na produção dos discos, de shows, na parte de vendas, no lance de fazer a banda trabalhar. Logo que ela morreu tínhamos uma data no Centro Cultural São Paulo, aí fizemos um show tributo, convidei alguns amigos que ela gostava e as Velhas Virgens (Paulão, Cavalo e o Caio) que ela adorava. Foi um grande show, uma bela homenagem. Mas lógico que ainda vamos fazer muita coisa em homenagem a alguém que ficou 19anos na banda, atuando com garra, com todo talento, com muita simpatia, nem tenho palavras pra dizer o que ela representou pro Made, pra mim, pros fãs... Ela era o lado bonito, charmoso e vermelho do Made. Nesse disco novo fiz uma música pra ela, “você é meu sol”, quando cantei pra ela a primeira vez, ela chorou dois dias de felicidade. Por uma coincidência do destino, ficou sendo uma homenagem póstuma em vida... Ainda estou atordoado com a morte dela...     

RU – Haverá uma nova voz feminina no lugar dela?
Oswaldo Vecchione – Sabe,o engraçado, que nós, eu, a Deborah, o Fabio, o Franklin Paolillo (batera que substitui o Rick em algumas viagens da Tour) e meu irmão Celso, viemos conversando no micro-ônibus na volta da última viagem do ano de 2008 (último show da Debinha) na volta de Telêmaco Borba/PR, e ficou acertado que iríamos convidar e incluir a Lu  Vitaliano, pra compor o backing do Made. O Fabio estava trabalhando com ela na banda “Os Vigaristas”, e tinha nos apresentado ela em um show no Blackmore Bar. A Debinha tinha gostado dela, e achava que poderia ser uma boa ter ela na banda. Quando chegamos acertamos com a Lu, que gostou e aceitou o convite, mas infelizmente as duas não chegaram a atuar juntas. A Lu na verdade fez os primeiros shows de 2009, mas logo depois saiu da banda, a pressão dos fãs do Made, que não tinham entendido e nem aceitado o lance todo da morte, e um convite para atuar numa peça de teatro tiraram ela da banda, ela na verdade é cantora e atriz. Depois convidamos a Renata “Tata” Martinelli, cantora que atua na noite e a Paulinha Mota, que tinha gravado junto com a Debinha os coros do CD “Rock de Verdade!”. A Renata já saiu e no lugar dela entrou a Roberta “Rock ‘n’ Roll” Abreu, cantora e atriz que conhecemos em um show em Presidente Prudente.   

RU – Algum plano para algum DVD? Aliás, o Made tem algum vídeo oficial, ou ainda bootleg?
Oswaldo Vecchione – Na verdade não temos nenhum DVD industrializado, mas oferecemos pros fãs uns quinze DVDs de shows, festivais e Programas raros de TV onde o Made tocou de verdade (coisas bem raras). Faço gravações em um estúdio que grava e imprime o rotulo de pequenas quantidades de DVDS e CDs. Eu tenho gravado registros de quase 200 shows do Made in Brazil em fita VHS. E Também nesses últimos quatro anos, temos um amigo, o Zé Luiz Pascuy que tem registrado em DVD os principais shows do Made, para um possível lançamento futuro. Tenho também um grande acervo de shows gravados em fita k- 7 e em MD, coisa de mais de 300 shows gravados. 

RU – Qual o contato que você tem com outras bandas, sejam da Pompéia, sejam da zona oeste de São Paulo, como Patrulha do Espaço, Golpe de Estado, Mutantes, O Terço, Casa das Máquinas, citadas na excelente faixa Festa Na Pompéia.
Oswaldo Vecchione – Estamos sempre nos falando, por telefone ou e-mail, fora o lance da amizade, tem também o lance da produtora, sempre estou oferecendo e tentando vender o show da rapaziada, dos amigos, bem como também distribuímos em nossa distribuidora os CDs e DVDs deles. Pra você ter uma idéia tenho vários projetos de Festivais, em um deles o Festival “Heróis do Rock”, oferecemos e vendemos quase todas as bandas dos anos setenta como: O Terço,Tutti Fruti, Patrulha do Espaço, Terreno Baldio, Som Nosso De Cada Dia, Pholhas, Blindagem, Sangue da Cidade, Celso Blues Boy, Serguei, etc. Temos projetos que envolvem muitas bandas, novas, velhas, amigos cantores , etc... O importante É o rock rolar e se der pra viajar, cair na estrada com os amigos melhor ainda...

RU – Assistindo ao documentário Botinada, sobre a cena Punk do Brasil, o pessoal citou que na época do surgimento do Punk na Inglaterra, em 76 e 77, os jornais brasileiros diziam que o Made In Brazil era uma banda Punk. Fale mais sobre isso.
Oswaldo Vecchione – O Made sempre foi uma banda de três notas, de três acordes, sempre fez um rock básico, simples, mas com muita energia, sempre tocou mais pesado do que as bandas brasileiras da época, e tinha também o lance da postura, uma coisa meio agressiva, como o som que fazíamos... Pra nós, pros músicos, o Made nunca foi Punk no som, mas não sei o que a crítica pensava, acho que talvez no bolo todo, no movimento de rock da época, lógico que o Made era a banda mais agressiva, a que tocava mais alto, com mais energia, com uma postura, uma imagem mais chocante em cima do palco e também fora dele. Talvez por isso alguns críticos e jornalistas da época tivessem rotulado a banda como a primeira banda punk do Brasil... Vendo por esse lado, consigo entender, pela postura da banda, nas atitudes do meu irmão Celso, que numa época quando enchia a cara saia brigando com meio mundo, e aí você imagina, acha que ia deixar ele brigar, apanhar sozinho...  Apanhávamos juntos, eu o restante dos músicos, a equipe, todos (risos). Nosso baterista na época o Ricardo Fenili “Britadeira”, também não levava desaforo pra casa, resolvia ali, na hora na mão... Não entendíamos na época porque uma parte do publico, ficava pedindo pra gente cuspir nas jaquetas, nas camisas, camisetas, eles estendiam pelo palco e ficavam pedindo, e ficavam felizes quando atendíamos os pedidos, quando cuspíamos... Hoje acho engraçado, mas na época, ficava meio chocado... Reza a lenda que o primeiro show que os carecas se reuniram e foram em peso, foi em um show nosso no ginásio do Corinthians em 1976.

RU – Fale sobre Massacre, recém-lançado agora, censurado em 1976. Por que este disco foi censurado, visto que o Made não era uma banda que fazia críticas ao regime militar?
Oswaldo Vecchione – Quem falou isso? Desde o nosso primeiro disco, tivemos músicas censuradas e proibidas, eu mesmo fui chamado no prédio da Censura no Rio de Janeiro (convocado, na marra) na época por duas vezes, uma vez durante a gravação do primeiro disco o “Banana” e depois na gravação do “Jack O Estripador”, pra justificar, dar explicações sobre algumas palavras, algumas frases em algumas letras. O “Massacre” que ia ser nosso terceiro lançamento, terceiro disco, acabou proibido pela Censura Federal. Tivemos letra censurada no primeiro disco o “Banana”, no “Jack”. No “Massacre”, chegamos a gravar dezesseis músicas, das quais dez foram censuradas e proibidas, aí a gravadora engavetou o projeto por causa dos vetos. O show Massacre foi proibido no dia da estréia nacional, no Teatro Aquários aqui em Sampa um dos maiores Teatros particulares do Brasil na época, que ficava na Bela Vista (Bexiga). O Teatro foi lacrado, com nosso equipamento dentro, som, luz, cenário, etc. O famoso tanque de guerra, que sustentava a bateria inclusive. Tivemos que fazer um show pra três ou quatro sensores, pra tentar liberar o show. Foram proibidas algumas músicas, que substituímos por musicas dos primeiros dois discos, mas o cenário, os efeitos de explosões, os fogos de artifício, o gelo seco, o tanque de guerra e outros pormenores, tivemos 24 horas pra alterar ou substituir detalhes ou por inteiro, ou não ia rolar uma autorização para o show e a tour acontecer. Esses detalhes todos contei no encarte do CD Massacre, que finalmente lançamos pela nossa gravadora. A censura pegou algumas músicas, algumas letras também do disco “Paulicéia desvairada” (1978) e do quarto o “Minha vida é Rock ‘n’ Roll” de 1980. Nunca chegamos a sermos presos, pela Ditadura Militar, mas chegamos perto várias vezes, fora às ameaças e intimidações.